Por Nilzardo Carneiro Leão
Também comentar o que não deve ser repetido no próximo ano: aquele Galo mirrado colocado na Ponte Duarte Coelho, chamado pelos foliões de Garerê (mistura de Galo com Saci Pererê), com uma perna só, sem as “esporas afiadas”, um micro-bico e sem a “crista de coral”, formoso que era pelo símbolo de vigor, peito imponente, asas fortes, cauda com penas multicoloridas, símbolo do Clube de Máscaras tal como desejado por Enéas Freire, seu criador. Convém, assim, esquecer “aquilo” que colocaram na Ponte, o anti-Galo da Madrugada.
Da mesma forma que no RJ os carnavalescos podem trazer para a Sapucaí uma grande águia a movimentar suas asas, abrir eu bico, por que o Galo do Recife não pode mostrar a sua grandiosidade , lançando os sons de seu canto que serão levados pelo Capibaribe para o oceano, para o mundo? Um Galo com “pernambucanidade”, exibindo a raça dos “bravos guerreiros”, que podem estufar o peito e cantar “Pernambuco, imortal, imortal.”
Se um “rebolation”, pobre de sonoridade, pode permitir o remelexo e o rebolamento, se as escolas de samba mantêm o “samba no pé” e se os cariocas fazem ressurgir as “bandas de bairro”, renascendo o autêntico e simples Carnaval do RJ, com suas marchinhas e suas fantasias, o pernambucano tem muito mais do que isso: tem a multiplicidade de seus ritmos, tem a alegria de seu povo a mostrar nas ruas, só ele pode apresentar um maestro Forró com sua orquestra, que bem poderia sair nos dias de Carnaval arrastando pelas ruas a multidão na “onda” do frevo. O “Escuta Levino”, que se apresenta na quinta-feira da semana pré-carnavalesca é um bom exemplo. Dêem força ao frevo e ao passo. Bom ser lida uma pequena-grande nota da Folha de Pernambuco, edição de 18 deste mês: querem ofuscar o que é nosso, “matar o genuíno frevo pernambucano apenas para atender a interesses comerciais e políticos.”
Deixem o povo “frevar” e fazer o passo livre, solto, de cada um, e não com passos harmônicos de uma escola de samba. Não precisamos importar nada. Temos já uma multiplicidade de cores, de tons e de sons, temos cantores e compositores que trazem o frevo no sangue. Temos novas orquestras e maestros, temos jovens bonitas e alegres trazendo o batuque do maracatu, temos a individualidade de cada com suas fantasias, a irreverência sadia, temos grupos familiares fantasiados pelas ruas. Nada de ficar em frente a grande palco para exibições de artistas de fora. Deixa pra lá.
Bom mesmo é chegar à Praça Maciel Pinheiro e aguardar, fantasiado, a saída do Bloco da Saudade. A expectativa, a chegada dos “perseguidores”, alinhando-se na calçada para seguir com ele até o bairro do Recife.
Flabelo pronto para as evoluções, orquestra e coral, o primeiro frevo de bloco, o seu próprio hino: “E o Bloco da Saudade assim recorda tudo o que passou.” E vem um dos momentos mais emocionantes: o ingresso na Rua da Imperatriz. Indescritível: “Vou relembrar o passado, do meu Carnaval de fervor...Na Rua da Imperatriz, eu era muito feliz, vendo os Blocos desfilar...”. E depois, “ Nós somos madeira, de lei que cupim não rói.” Ao final da rua, na subida da Ponte, “até o rio parou de correr.... só para ver meu bloco de recordações.” E assim segue o alegre Bloco da Saudade até o bairro do Recife, a mostrar que “O Recife tem, o Carnaval melhor do meu Brasil.”
O que trás imensa alegria é, no dia seguinte, ver toda a casa vestida de Carnaval: “escapulários” na sala, chapéus na mesa, adereços nos quartos. No terraço, gola e cabeleira de maracatu, um chapéu de couro igual ao de um cangaceiro. Como se estivessem todos a dizer: não fique triste, para o ano tem mais...
Fonte: Texto extraído de matéria vinculada no site do Instituto Arqueológico Histórico e Geográfico de Pernambuco