Publicado no site Besta Fubana.
Com o advento da abolição da escravatura negra
(1888), e o surgimento da República (1889), tornaram-se mais frequentes o
aparecimento de novos clubes carnavalescos, com todos os elementos integrantes
dos desfiles militares acrescidos da influência das procissões religiosas; como
é o caso do estandarte, uma cópia dos pendões das corporações profissionais e
das irmandades e confrarias, hoje símbolo quase da maior parte das agremiações
carnavalescas.
Oriundos de grupos profissionais de operários urbanos, os Clubes Carnavalescos Vassourinhas (1889), das Pás (1890), Lenhadores (1897), Pão Duro (1916), Toureiros de Santo Antônio (1916), Prato Misterioso (1919), além de outros mais recentes, chegaram até os nossos dias. Outros, porém, como Caiadores, Empalhadores, Operários, Jornaleiros, Suineiros, Quitandeiras, não mais existem.
As rivalidades entre as agremiações sempre foram uma constante no carnaval de Pernambuco. Com tal clima e elementos, os capoeiras, “brabos” e “valentões” passaram a praticar “exercícios de capoeiragem” em frente aos cordões carnavalescos - A Pimenta (1901). Tais exibições de capoeiragem quando nada redundavam em agressões, como a narrada pelo Jornal Pequeno, de fevereiro de 1907, em que foi vítima o diretor do Clube Carnavalesco Tome Farofa.
Procurando esconder-se das perseguições dos Chefes de Polícia, o nosso capoeira foi maneirando os seus passos - “rabos de arraia”, “pernadas”, “cabeçadas”, “pisões”, etc – criando assim uma coreografia própria de modo a acompanhar a “onda”. Nesta coreografia, onde não foi desprezada totalmente a agressividade, foram aparecendo passos que, por determinadas semelhanças, passaram a possuir denominações próprias.
O capoeira de ontem originou o passista de hoje: Camisa multicolorida, aberta no peito e amarrada na cintura, ou ainda camisa de malha com três cores; sapato tênis branco; bermuda ou calça arregaçada; chapéu de palha e um “chapéu-de-sol” desbotado a complementar a indumentária; bem dentro da descrição do nosso Capiba:
Oriundos de grupos profissionais de operários urbanos, os Clubes Carnavalescos Vassourinhas (1889), das Pás (1890), Lenhadores (1897), Pão Duro (1916), Toureiros de Santo Antônio (1916), Prato Misterioso (1919), além de outros mais recentes, chegaram até os nossos dias. Outros, porém, como Caiadores, Empalhadores, Operários, Jornaleiros, Suineiros, Quitandeiras, não mais existem.
As rivalidades entre as agremiações sempre foram uma constante no carnaval de Pernambuco. Com tal clima e elementos, os capoeiras, “brabos” e “valentões” passaram a praticar “exercícios de capoeiragem” em frente aos cordões carnavalescos - A Pimenta (1901). Tais exibições de capoeiragem quando nada redundavam em agressões, como a narrada pelo Jornal Pequeno, de fevereiro de 1907, em que foi vítima o diretor do Clube Carnavalesco Tome Farofa.
Procurando esconder-se das perseguições dos Chefes de Polícia, o nosso capoeira foi maneirando os seus passos - “rabos de arraia”, “pernadas”, “cabeçadas”, “pisões”, etc – criando assim uma coreografia própria de modo a acompanhar a “onda”. Nesta coreografia, onde não foi desprezada totalmente a agressividade, foram aparecendo passos que, por determinadas semelhanças, passaram a possuir denominações próprias.
O capoeira de ontem originou o passista de hoje: Camisa multicolorida, aberta no peito e amarrada na cintura, ou ainda camisa de malha com três cores; sapato tênis branco; bermuda ou calça arregaçada; chapéu de palha e um “chapéu-de-sol” desbotado a complementar a indumentária; bem dentro da descrição do nosso Capiba:
De chapéu-de-sol aberto
Pelas ruas, eu vou…
A multidão me acompanha…
Eu vou!…
Eu vou e venho, pra onde não sei
Só sei que carrego alegria,
Pra dar e vender!
Pelas ruas, eu vou…
A multidão me acompanha…
Eu vou!…
Eu vou e venho, pra onde não sei
Só sei que carrego alegria,
Pra dar e vender!
Três goles de cachaça, um “frevo rasgado” oriundo de
uma fanfarra, bastam para transmudar esse homem num demônio, que até parece
ter o “diabo no couro”, tal o número de complicados passos que passa a
fazer.
A exemplo de seus ancestrais, traz quase sempre um chapéu-de-sol na mão, alguns até sem pano (“sombrinhas borboletas”), como um remanescente do cacete ou da bengala dos tempos idos.
Quando nos cordões dos clubes ou troças, os passistas envergam um bastão encimado pelo distintivo da agremiação – machado, vassouras, pás, prato, ave, bacia, etc – dependendo pertencer ele ao Lenhadores, Vassourinhas, Pás Douradas, Prato Misterioso, Papagaio Falador ou Lavadeiras de Areias. Mas nos cordões o “passo rasgado” é raro, a coreografia obedece mais a uma evolução não dando margem a grandes criações; estas ficam por conta dos grupos e passistas, alguns especialmente contratados, que acompanham a agremiação.
Os passistas modernos, geralmente formando uma ala especial nas grandes agremiações, passaram a usar sombrinhas coloridas de 50 centímetros de comprimento por 60 de diâmetro, a fim de facilitar passos que são verdadeiras acrobacias: “vôo da andorinha”, “tesoura no ar”, “coice de burro”, “tesoura cruzando”, “canguru”, “tesoura passando a sombrinha”, “trem de ferro”, dentre outros.
Os chamados “Concursos de Passo”, desenvolvido pelos jornais e posteriormente pelas emissoras de rádio e televisão, vieram incentivar a criatividade dos passistas. Assim despontaram, chegando a fazer escola, Egídio Bezerra, hoje falecido, mas em sua época conhecido como o “Rei do Passo”, “Sete Molas”, “Nascimento do Passo” (Francisco Nascimento Filho), “Coruja”, (Arnaldo Francisco das Neves), que vieram a ser professores de “Pipoca”, Antúlio Madureira, “Meia-Noite” e tantos outros representantes da nova geração de passistas.
“No mar do frevo, cada peixinho nada de seu jeito” – diz com muita propriedade Luís da Câmara Cascudo, em depoimento pessoal, acrescentando: “Frevo, glória pernambucana, autêntico, positivo, real, nas músicas de sua dinâmica contagiante e mágica. No passo, cada bailarino executa ad libitum a reação mímica da interpretação pessoal. Música determinante de agilidades inesperadas, piruetas famosas, na sombra simbólica da sombrinhas borboletas”.
Este é segundo Guerra Peixe uma outra característica do frevo, no seu aspecto dança que o pernambucano denomina de passo: “e aí encontramos um fenômeno único na música popular brasileira. É a única dança em que o dançarino dança a orquestração. Cada volteio de um instrumento é acompanhado por um passo ou uma firula [volteio, rodeio] do passista. É uma dança individual, com a maioria dos passos tradicionalizados , mas que cada um executa a sua maneira” (¹).
A afirmação do grande musicista fluminense, que por alguns anos pesquisou o Carnaval do Recife, porém, não se aplica a certos “professores”, “mestres” como se autodenominam, das escolas de passo dos nossos dias, mais para balé de teatro de revista do que mesmo para o verdadeiro passo pernambucano.
Empolgados com elogios dos desavisados, mequetrefes das mais caras e verdadeiras tradições do carnaval pernambucano, nem de longe acompanham a orquestração da partitura original, põem-se a dar pinotes, numa coreografia mais próxima da ginástica aeróbica de alto impacto, numa demonstração inconsequente de uma sucessão de falsas acrobacias, quando a orquestra está a executar um solo de requinta ou saxofones. Em tais demonstrações, numa total e absoluta heresia, chegam esses “mestres” a exibir passos característicos dos frevos-de-rua na parte vocal de um frevo-canção (!).
A exemplo de seus ancestrais, traz quase sempre um chapéu-de-sol na mão, alguns até sem pano (“sombrinhas borboletas”), como um remanescente do cacete ou da bengala dos tempos idos.
Quando nos cordões dos clubes ou troças, os passistas envergam um bastão encimado pelo distintivo da agremiação – machado, vassouras, pás, prato, ave, bacia, etc – dependendo pertencer ele ao Lenhadores, Vassourinhas, Pás Douradas, Prato Misterioso, Papagaio Falador ou Lavadeiras de Areias. Mas nos cordões o “passo rasgado” é raro, a coreografia obedece mais a uma evolução não dando margem a grandes criações; estas ficam por conta dos grupos e passistas, alguns especialmente contratados, que acompanham a agremiação.
Os passistas modernos, geralmente formando uma ala especial nas grandes agremiações, passaram a usar sombrinhas coloridas de 50 centímetros de comprimento por 60 de diâmetro, a fim de facilitar passos que são verdadeiras acrobacias: “vôo da andorinha”, “tesoura no ar”, “coice de burro”, “tesoura cruzando”, “canguru”, “tesoura passando a sombrinha”, “trem de ferro”, dentre outros.
Os chamados “Concursos de Passo”, desenvolvido pelos jornais e posteriormente pelas emissoras de rádio e televisão, vieram incentivar a criatividade dos passistas. Assim despontaram, chegando a fazer escola, Egídio Bezerra, hoje falecido, mas em sua época conhecido como o “Rei do Passo”, “Sete Molas”, “Nascimento do Passo” (Francisco Nascimento Filho), “Coruja”, (Arnaldo Francisco das Neves), que vieram a ser professores de “Pipoca”, Antúlio Madureira, “Meia-Noite” e tantos outros representantes da nova geração de passistas.
“No mar do frevo, cada peixinho nada de seu jeito” – diz com muita propriedade Luís da Câmara Cascudo, em depoimento pessoal, acrescentando: “Frevo, glória pernambucana, autêntico, positivo, real, nas músicas de sua dinâmica contagiante e mágica. No passo, cada bailarino executa ad libitum a reação mímica da interpretação pessoal. Música determinante de agilidades inesperadas, piruetas famosas, na sombra simbólica da sombrinhas borboletas”.
Este é segundo Guerra Peixe uma outra característica do frevo, no seu aspecto dança que o pernambucano denomina de passo: “e aí encontramos um fenômeno único na música popular brasileira. É a única dança em que o dançarino dança a orquestração. Cada volteio de um instrumento é acompanhado por um passo ou uma firula [volteio, rodeio] do passista. É uma dança individual, com a maioria dos passos tradicionalizados , mas que cada um executa a sua maneira” (¹).
A afirmação do grande musicista fluminense, que por alguns anos pesquisou o Carnaval do Recife, porém, não se aplica a certos “professores”, “mestres” como se autodenominam, das escolas de passo dos nossos dias, mais para balé de teatro de revista do que mesmo para o verdadeiro passo pernambucano.
Empolgados com elogios dos desavisados, mequetrefes das mais caras e verdadeiras tradições do carnaval pernambucano, nem de longe acompanham a orquestração da partitura original, põem-se a dar pinotes, numa coreografia mais próxima da ginástica aeróbica de alto impacto, numa demonstração inconsequente de uma sucessão de falsas acrobacias, quando a orquestra está a executar um solo de requinta ou saxofones. Em tais demonstrações, numa total e absoluta heresia, chegam esses “mestres” a exibir passos característicos dos frevos-de-rua na parte vocal de um frevo-canção (!).
É demais!
O frevo tem tantos passos quanto a inventiva do
passista permitir, desde que sua coreografia venha obedecer ao andamento da
orquestração da partitura que está sendo executada pela orquestra ou banda de
música. No passado, em 1976, em pesquisa realizada com o próprio
“Nascimento do Passo” (Francisco Nascimento Filho), ainda na sua pureza de
artista popular, e Coruja (Arnaldo Francisco das Neves), este músico
ritmista (pandeiro) e festejado passista do carnaval do Recife, relacionamos e
catalogamos, em trabalho conjunto com a Prof. Jurandy Austermann, da
Equipe do Departamento de Cultura da Secretaria de Educação e Cultura do Estado
de Pernambuco, 48 passos, sem contar com os do porta-estandarte, 21 dos
quais foram detalhados na publicação Ritmos e Danças – Frevo 2, do mesmo
Departamento (²)
Da observação da vida, o passista cria os nomes dos seus passos: “saca-rolha”, “canguru”, “tesoura”, “locomotiva”, “chá de bundinha”, “carrossel”, “pisando em brasa”, “urubu baleado”, “é de bandinha que eu vou”, “ferrolho”, “tramela”, “passeando na Pracinha” (referência à Praça da Independência, popularmente conhecida por Pracinha do Diario, chamada de “Quartel-General do Frevo”), “encaracolado”, “plantando mandioca”, “parafuso” e uma infinidade de outros que variam segundo os seus executantes.
Mário de Andrade, em depoimento citado por Valdemar de Oliveira, referindo-se à coreografia do frevo sintetiza:
Da observação da vida, o passista cria os nomes dos seus passos: “saca-rolha”, “canguru”, “tesoura”, “locomotiva”, “chá de bundinha”, “carrossel”, “pisando em brasa”, “urubu baleado”, “é de bandinha que eu vou”, “ferrolho”, “tramela”, “passeando na Pracinha” (referência à Praça da Independência, popularmente conhecida por Pracinha do Diario, chamada de “Quartel-General do Frevo”), “encaracolado”, “plantando mandioca”, “parafuso” e uma infinidade de outros que variam segundo os seus executantes.
Mário de Andrade, em depoimento citado por Valdemar de Oliveira, referindo-se à coreografia do frevo sintetiza:
A vibração paroxística do frevo é realmente uma
coisa assombrosa. É, enfim, um verdadeiro allegro num presto nacional. É,
sem dúvida, o entusiasmo, a ardência orgíaca, mais dionisíaca de nossa música
nacional. E aquele rapaz que dançou! Mas, será possível que uma coreografia
assim ainda se conserve ignorada dos nossos teatros e bailarinos? Que beleza!
Que leveza admirável! É uma fonte riquíssima. É um verdadeiro título de glória
que o país ignora, simplesmente porque entre nós são muito raros os que têm
verdadeira convicção de cultura (³)
Daí a afirmativa de Capiba, em um dos seus mais conhecidos frevos-canção:
Pernambuco tem uma dança
Que nenhuma terra tem
Quando a gente entra na dança
Não se lembra de ninguém
Que nenhuma terra tem
Quando a gente entra na dança
Não se lembra de ninguém
É maracatu, não!
Mas podia ser.
É bumba-meu-boi, não!
Mas podia ser.
Não será o baião, não!
Mas podia ser,
É dança de roda, não!
Quero ver dizer…
Mas podia ser.
É bumba-meu-boi, não!
Mas podia ser.
Não será o baião, não!
Mas podia ser,
É dança de roda, não!
Quero ver dizer…
É uma dança
Que vai e que vem
Que mexe com a gente
É frevo, meu bem!
Que vai e que vem
Que mexe com a gente
É frevo, meu bem!
_______________
1) GUERRA-PEIXE, César. art. cit.
2) SILVA, Leonardo Dantas. Ritmos e danças –
Frevo. Recife: Governo do Estado de Pernambuco; MEC – FUNARTE, 1978. 44 p. il.
Contém um disco com seis frevos-de-rua.
3) OLIVEIRA, Valdemar de. Frevo, capoeira e passo.
Recife: Companhia Editora de Pernambuco, 1971. p. 119.
É frevo, meu bem! marcou muito minha infância, ao lado de tantas outras músicas de Capiba, Nelson Ferreira e Levino. Para mil é um dos mais lindos frevos do cancioneiro carnavalesco pernambucano. Uma combinação perfeita de letra e melodia que somente iluminados como o Mestre Capiba poderiam compor.
ResponderExcluir